Uma formiguinha na Grécia

A Grécia é um país de excessos: demasiado bonito, demasiado montanhoso, demasiado quente (em Agosto, claro, sina de professora -- 2000, a propósito), tem demasiadas ilhas (incontáveis), demasiado mar (nenhum ponto do seu território dista mais de 75 km da costa), demasiados mares (Jónico, Egeu e Mediterrâneo), demasiados vestígios arqueológicos (que, ao fim de três dias, passado o respeito inicial, acabamos a apelidar familiarmente de "calhaus"), demasiados turistas... A comida é demasiado boa (as moussakas, senhor, as moussakas... e o kataifi, o tzatziki, o peixe, a fruta...), o vinho retsina demasiado mau (essência de Sonasol Verde, segundo a Ana Isabel), o mar demasiado azul, tépido, calmo e límpido, os condutores demasiado maus (alguém me há-de explicar as estatísticas que põem Portugal no top da sinistralidade rodoviária), a língua e o alfabeto demasiado complicados...
No entanto, logo ao segundo dia, o que mais se insinua, demasiado persistente e irritante, é um som de fundo que penetra nos nossos ouvidos e faz todo o percurso interno até atingir cada um dos nossos neurónios. Nas avenidas atenienses, é abafado pelo tráfego automóvel, nas ruas mais pequenas, pelo bulício do comércio de uma cidade meio indefinida entre o Ocidente e o Oriente. Mas basta tomarmos as ruelas da Plaka, que sobem até à Acrópole, determo-nos um pouco na Ágora antiga, talvez a beber um Frappé (Nescafé gelado), numa esplanada, à sombra de uma latada, ou sairmos da cidade e embrenharmo-nos pelo campo, e lá vem ele, como que exalado das árvores e do calor. Um cri-cri elevado a uma potência com muitos zeros, capaz de liquidificar o cérebro a qualquer um. Uma análise mais atenta dos troncos das árvores (por alguém menos míope que eu) revela uns insectozinhos camuflados, quase imperceptíveis na forma, que não no conteúdo: Cicada fraxini, de seu nome científico.
Apesar de todo o amor universal que me merece qualquer ser vivente, não consegui deixar de sentir uma satisfaçãozinha interna ao pensar que, chegado o Inverno, todos aqueles bichinhos que tanto cantavam haviam de dançar como o Zorba...

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