InterRail 2005 (I)

O Pedro ainda não tomou posse do espaço cibernético que lhe é devido, mas continua a viajar e a ter muito que contar. Nas suas próprias palavras: «Acho que se tenho calhado de nascer na época dos Descobrimentos, eu devia ser daqueles que iam à procura do fim do mundo... e continuavam ao descobrirem que ele não terminava ali».
Acalenta vários projectos para quando concluir o curso: uma viagem coast-to-coast, de carro pelos EUA, com incursões pelo México e pelo Canadá, e ainda umas primeiras experiências profissionais que o levem a países europeus distantes do nosso (por exemplo, Lituânia, Estónia, Letónia, Suécia, Islândia ou Chipre).
De momento, prontificou-se a partilhar as suas memórias do último InterRail que realizou. Segue, então, o primeiro episódio, com os meus agradecimentos ao Pedro.
Parti dia 30 de Julho. Tal como no ano anterior, foi na companhia de um amigo que fui novamente passar o mês de Agosto a desbravar o continente europeu e, tal como nos anos anteriores, o problema foi mesmo sair de Portugal... a linha estava novamente (!) cortada devido a um incêndio e foi com algum alívio que deixei terras lusas... terras de Portugal.
À passagem por Vilar Formoso, já o relógio assinalava as horas bem para lá da meia-noite. A sempre necessária versatilidade de quem se mete nestas andanças cedo teve asas para voar. O comboio estava quase lotado e, se bem recordo, éramos seis na cabine... não dava para dormir deitado. Tirei o meu saco-cama e tomei posse do meio metro quadrado de espaço a que tinha direito. Após meia hora, com o desconforto a aumentar, lá foram as minhas pernas aterrar na cadeira da frente, onde uma rapariga sonolenta descaía intermitentemente, ora para a esquerda, ora para a direita. A noite decorreu assim, neste esticar, encolher de pernas, meio a dormir, meio acordado.
Apesar de ainda se tratar do primeiro dia, foi já com algum cansaço que cheguei a Hendaye. Lembrando-me do ano anterior, recordei que só ao fim de alguns dias o corpo estaria habituado às agruras de chamar casa a um comboio... e de tantas em tantas horas ter de mudar de casa, qual maltrapilho errante... Nem todos aguentam, mas é muito, muito interessante...
Recordo-me perfeitamente de que chovia imenso em Hendaye. Ainda ensaiei uns passos junto à praia mais próxima, mas quando a chuva apertou regressei num ápice, já um pouco encharcado, à estação e foi na companhia do meu fiel amigo de viagem (um livrinho de Edgar Allan Poe, em inglês) que passei, tranquilamente, as horas seguintes. De vez em quando, olhava para a minha máquina digital e para o telemóvel que deixara a carregar numa tomada num canto mais resguardado da estação.
Foi já em França que constatei o medo crescente dos atentados terroristas. Pela primeira vez, encontrei a estação de Hendaye policiada (e logo por polícias com metralhadoras a tiracolo) e assisti à interpelação de várias pessoas de tez mais escura. Um cidadão asiático creio ter sido mesmo detido nessa altura, pois foi com os polícias para uma sala e não mais o tornei a ver, enquanto ainda permaneci na estação.
À tardinha, finalmente, embarquei, rumo a Paris.


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Texto de Pedro Bicho
Horário e mapa do Sud-Expresso de CP

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