Looking for yourself out there

Faz agora 6 anos era lançado o álbum a que esta canção emprestou o título. Consta que ela andou nos tops mais de 52 semanas, o que equivale a dizer que passou insistentemente nas rádios durante mais de um ano. Ainda agora, de vez em quando, surge por entre as ondas FM, quando me fazem companhia, naqueles momentos aborrecidos de secretária desta vida de professora. Nessas alturas, não resisto a aumentar o volume, fechar os olhos e deixar-me transportar até ao Verão de 2001, para dentro do então carro da Audrey, pelas auto-estradas da América fora, aquelas cuja portagem se pagava com uma ficha atirada para dentro de um cesto, à laia de basquetebol.
Semanas gloriosas, de um Agosto muito quente, com uma onda de calor a assolar a Nova Inglaterra, e nós no carro, a cantar por cima do rádio e a contar state line atrás de state line: Massachusetts, New Hampshire, Maine, Vermont, New York,...



Semanas memoráveis, quando este mundo era outro e os americanos afrouxaram as regras de segurança, permitindo a entrada no país sem visto a um maior número de visitantes estrangeiros, entre os quais os portugueses, e entre eles eu.
Foi assim que rumei a Boston, com escala em Newark, passaporte na mão, a puxar o meu trolley pequeno (ainda me lembro da cara da Audrey, quando lhe disse que não tinha mais bagagem, mas a tua mãe tem máquina de lavar roupa, não é? Detesto desfiles de moda!).
Guardo nitidamente na memória a primeira imagem do solo norte-americano, quando, ao desembarcar no aeroporto de Newark, passada a manga e um longo corredor vazio, fui recebida, ao virar de uma esquina, por uma parede verde-água com a inscrição em letras garrafais: «Welcome to the United States of America». Numa fracção de segundo, passaram-me em turbilhão imagens do muro junto à fronteira com o México e das jangadas cubanas, o som dos Zebda: «Je suis venu, mais je suis pas venu, tu penses, m'entendre dire: Sois le bienvenu» e o estranho desconforto de me sentir uma ocidental privilegiada.
A primeira vez que o vi, o carro da Audrey, foi no estacionamento do aeroporto de Boston. Lembro-me de ter reparado numa mancha gordurosa no chão: «O depósito tem uma fuga, mas na oficina disseram que não é grave, que aguenta até ao fim-de-semana. O meu mecânico no Vermont depois vê». Ainda tentei argumentar que uma fuga de combustível não me parecia um diagnóstico muito saudável, mas o cansaço de uma viagem longa, 5 horas de atraso no relógio e as perspectivas de atravessar Boston ainda com luz e de um duche no apartamento da Audrey, em Somersworth, New Hampshire, depressa me fizeram entrar no carro sem mais questões. Escusado será dizer que o carro já não saiu esse fim-de-semana da oficina e que a Audrey teve de voltar ao trabalho (ainda na PanAm, até ao final desse ano, depois foi o que já se sabe, naquela como nas outras companhias de aviação) com o carro da Ana.
Foi assim que me vi presa uma semana em Lowell, Vermont, sem grandes possibilidades de movimentação, mas com uma oportunidade ímpar de conhecer o American way of life na América rural profunda, entre montes verdes, pontes cobertas, vacas (aquelas que dão o leitinho com que se produz o Cabot Cheese), colibris, esquilos, doninhas fedorentas, telenovelas mexicanas, general stores, quedas de água, campos de girassóis e uma estranha ausência de alces.



Imagens do vídeo de Red Hot Chili Peppers, realizado por Stephane Sednaoui, Scar Tissue, Moebetoblame Music, BMI / Warner Bros. Records Inc., 1999.
Uma América menos verde, mas bem road movie.

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